[Imagem: The little violinist sleeping - Antoine Auguste Ernest Hebert
Vídeo - Wake me up when september ends - Green Day
Ao vociferar explosivo do cacho de bougainvilles
A vidraça treme o carmim-solferino que a transpassa.
Vem colher-me aquele tiro de cor
Cuja espoleta é a própria luz irradiada – contra-muro,
E, como alvo fácil, fatigado,
Tombo sangrando invisivelmente.
Beleza violenta e certeira.
Listram-se persianas,
Escorrem tremeluzes derretidas
Alagando o carpete até os pés da moça.
E meus olhos arvorados, carcomidos pelas entrefrestas,
Refugiam-se, castrados, num ponto ou noutro
Onde seja possível sobreviverem ao que lhes resta.
Os bougainvilles disparam, frenéticos,
Projéteis teleguiados
Diretamente contra minhas retinas desprotegidas.
Como passa a manhã sobre os papéis!
Maços de cartas, datas amassadas, calendários.
(E eu, que anteontem era moço).
As teclas de um a nove ou de um a zero,
E todas as canetas em alinhamento marcial.
Como se agora, e só agora, tivesse me ocorrido
Que foi transe alucinógeno e nada mais.
(E eu, que anteontem).
Meus cabelos excessivamente curtos e brancos,
Meus ombros largos e fatigados,
Meus dentes de siso inclusos e decíduos
Meus dias devotados à paz insípida.
Meus pés dentro desses sapatos caros.
Tudo passa
Mesmo o cacho de bougainvilles.
Mesmo o cacho de bougainvilles que,
Antes ainda do dia de finados
Não será nada além da lembrança carmim-solferino
De toda a sua beleza.
Ou será, será, por ter sido exatamente aquilo:
A lembrança carmim-solferino
De toda a sua beleza.
[Dos: POEMAS RECÉM-NASCIDOS]