FESTA DE SÃO FIRMINO
Amigos que te viraram as costas
Bebem no bar a aguardente que era tua.
Festejam-te a ausência.
A mulher que te amava
Desliza, fricciona a pele delicadamente
Contra outra pele, pêlos
Que não são os teus.
E Judas também te traiu.
E o que era para ser-te um beijo de amor
Tornou-se a flor exposta de tuas fragilidades.
Entregou-te o coração em ânfora de barro.
E os cães o cheiraram. E os homens se riram dele.
Teu cavalo se recusa
A dar-te lombo, trote, fuga.
Tem o coice pronto à tua têmpora.
Está velho e fraco,
Contudo, não aceita
Ser a montaria de um derrotado.
Vês os touros?
É a hora.
Arranca tuas últimas roupas
Como se raspasse os pêlos, um pouco de pele e carne.
Desfaz-se de teus sapatos e de tuas meias sem par.
Tens as calçadas e as janelas
Por testemunhas
Os olhos incrédulos de teus acusadores
Como juízes imparciais.
Avança! Avança, homem.
Volta-te, ao contrário da multidão,
E confronta os touros debandados.
Um deles há de ter o chifre perfeito
Para que teu peito seja perfurado.
...
No bar, a aguardente já não desce.
A mulher enxuga o rosto com encardidos lençóis.
Antevendo a corda, Judas estremece. Escurece ao meio-dia.
Sobre cela fria, sob os olhares baixos dos juízes e da malta
Estende-se a única bandeira que falta. Seu corpo nu, pisoteado.
...E o cavalo o conduz delicadamente, como o fizesse à última [Godiva.
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