"PORQUE NARCISO ACHA FEIO O QUE NÃO É ESPELHO" (Caetano Veloso).

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

VAGA SENSUAL


[Imagem: Study of a Nude
Jean-Auguste-Dominique Ingres
Vídeo: Tu es ma came - Carla Bruni]

Deite o teu charuto,
Teu conhaque,
Teu livro de cabeceira.
Na poltrona de couro
Repousa o Douro
Em rótulo de vinho.
Mas para o teu havana
Melhor mesmo esse conhaque,
Essa bebida bacana;
Assim como o seria
Para acompanhar tua alva sangria
Uma orquestra de atabaques.

Lanha tua lenha
Na lareira.
É frio ou chove ou é charme,
Aquecer os pés,
Aquecer a goela,
Esquecê-los dormentes
Entre o copo, a almofada e a vela.
Lenha que se consome.
E tua fome cedendo às ameaças
Do álcool e da fumaça.
Porque de outra forma, homem,
Não teria a menor,
A remota, a mínima graça.

E se te deitarem no colo,
Te oferece;
Mostra teu peito macio
Pelo, alcova, cova, cama,
E se te morrerem no colo
Por um pouco,
Esquece os teus vícios
E dê-se ao sacrifício
De acariciar.
Ama quem te fez
Pelo, alcova, cova, colo, cama.

E se te quiserem mais
Não se acanhe.
Deite teu prazer de fumo
Teu copo raso de conhaque
Teu livro gasto de cabeceira
Deixe chegar a canseira
Desarme a guarda para o ataque
Ofereça-se ao consumo.

Para que regrar
O que não finda?
Para que guardar na fonte
O que abundante jorra?
Nada!
Há mais tabaco para queimar
Na guimba,
Tonéis de bebida
Para se ir à forra;
Farta-te do que de derem,
Lambe e lambuza
Usa
Não recusa nem te afasta.
Enche teu copo,
Acende um outro,
Fecha o teu livro e aproveita.

Não gasta!

[Dos: POEMAS RECÉM-NASCIDOS]

11 comentários:

Eliane Furtado disse...

Oi Poeta, estava lendo um artigo da Eliane Brum da Época, e ela afirmava que quando a gente viaja leva o nosso espelho. Lembrei de vc. Falou em espelho agora...ksksksk
Na postagem de hoje..."e se te quiserem mais..." Lindo. Lindo o poema de hoje.
bj

AGNALDO NO ESPELHO disse...

Eliane querida,

Acabei de postar uma resposta ao seu comentário anterior, justamente destacando sua delicadeza. E considero lindo isso de me associar aos espelhos. Já te disse que busco constantemente a irmandade das coisas, a objetificação, a comunhão com tudo o que há, desde os seres repletos de alma até a matéria inanimada.

A partir de agora vou ficar torcendo para que os espelhos te "persigam" (no bom sentido, claro). Assim você se vê, bela e vitoriosa e, de relance, lembra do meu espelho.

Quanto ao poema, resolvi postar algo mais leve, mais "malemolente" (desenterrei esse termo).

Para contrapor o excesso de alma, um pouco de corpo...

Super beijo.

Zélia Guardiano disse...

Meu querido Agnaldo
Ontem vim aqui e li, li, reli, li outro tanto.
Iniciei um comentário, apaguei, deixei pra depois: as minhas palavras não estavam à altura dos teus versos.
Fui embora.
Agora, volto, mas outra vez, com palavras ao rés do chão...
A alma, esta sim, lá em cima, levada pela tua magnífica poesia.
Sem comentério...
Forte abraço, grande poeta!

Vera do sulllll disse...

Boa Noite Agnaldo.
Tenho lido todos os dias o teu blog e a cada dia surge um poema mais lindo e profundo que o outro. Deus te privilegiou com esta capacidade enorme com a palavras, você é ILUMINADO. Muitas vezes faço como a Zélia, leio, reflito e reflito novamente pois tudo o que escreves nos faz pensar e TENTAR entender esta linguagem que só os especiais sabem o que quer dizer.
Tenha uma ótima noite e um lindo final de semana. Não esqueças de votar no menos pior... rsrsrsr

AGNALDO NO ESPELHO disse...

Zélia, Zélia, Zélia...

A sombra de sua presença já deixa o ar mais calmo. Respeito seu silêncio, embora sinta falta de suas palavras que, a meu ver, sempre estão e sempre estiveram à altura. Ou melhor, não há que se comparar uma coisa com a outra, porque cada uma carrega a beleza que pode.

De qualquer sorte, senti o perfume de tua poesia passando por aqui, e desconfiei que fosse você do outro lado da janela...

Agora você veio e tudo está bem. Bem e calmo. Como a casa de um amigo ansioso, depois que o outro aparece de surpresa.

Super beijo e venha sempre, em silêncio ou não. Você escolhe.

AGNALDO NO ESPELHO disse...

Vera,

Suas palavras confortam qualquer angústia literária. Essa sensação de escravidão que se tem ao escrever (escravidão auto-imposta, é bom que se diga) sem saber se as palavras encontrarão eco ou servirão de alento, estímulo ou provocação.

...E você vem e diz que passa por aqui todos os dias para se encontrar com meus versos...

Olha, vou te dizer uma coisa, isso é bálsamo!

Mas não se acanhe nem se furte de comentar. Os poemas não carregam sentido preciso, portanto, têm um sentido para cada um e jamais haverá interpretação melhor ou pior. O que espero que haja, sempre, é a sensação intransferível, pessoal, qualquer que seja ela, porque daí advém a apreensão do poema e do que ele reservou especialmente para nós.

Doravante, façamos o seguinte: você continua à vontade para comentar quando quiser; eu, por meu turno, sempre que postar, saberei que você lerá e isso já me fará feliz por antecipação.

Super beijo.

Anônimo disse...

Pior é deixar vencer; melhor que se tente usufruir... Dá vontade de beber seu poema até a última gota, objetivo alcançado! ;)

Beijo.

AGNALDO NO ESPELHO disse...

Lara,

Você.como sempre, breve e precisa. Melhor mesmo e se deixar vencer, dominar e usufruir. Concordo plenamente.

Pois se deu vontade, beba! O poema serve para isso. Para ser comido, bebido, devorado antropofagicamente, como se fosse parte de nós mesmos.

Super beijo.

Eliane Furtado disse...

Agnaldo Poeta, isto! Faça sempre o contra ponto. Algo leve, algo profundo. Me permite esta sugestão? Fica mais misterioso e energizante.
Quanto ao Espelho...é verdade! Passei a enxergar com outros olhos as imagens refletidas nele.
E lembrar de vc.

Neuzza Pinheiro disse...

ah, eu bebo, como e lambo os "beiços", rsrs
Viva essa mulher, uau, que voz macia!
E ese violão mandando blues com esse baixo de pau?
Lindoooooo, Agnaldo!!

AGNALDO NO ESPELHO disse...

Neuzza querida,

E além de linda e talentosa, ela é simplesmente a primeira-dama francesa, Carla Bruni Sarkosy. De origem italiana (só podia, né? com esse savoir fair...).

Quis dividir com você porque sabia que iria gostar.

Super beijo.