"PORQUE NARCISO ACHA FEIO O QUE NÃO É ESPELHO" (Caetano Veloso).

terça-feira, 14 de julho de 2009

CRÔNICA DA TARDE.


FLAMBOIAIÃ

Em frente à casa havia um flamboaiã dos grandes. Bem verdade, seria impossível precisar; poderia não ser grande à época, porque os olhos que se admiravam eram de criança. (O mundo é sempre imenso para elas).

Certa época do ano a árvore punha brotos lindos, semelhantes a rendas, verdinhas de fazer gosto. (Objeto de brincar). Crianças de sítio desprovidas dos brinquedos do comércio tradicional, se arrumam como podem, e as folhas novas se mostravam adequadas às suas fantasias.

Para colhê-las faziam o seguinte: a prima espreitava que as mães não aparecessem e ele escalava rapidamente o tronco, alcançava o melhor galho e de lá ia deitando ao chão as toalhinhas rendadas. Outras vezes ela é quem subia, meio desajeitada. Queria mostrar que podia.

Certa feita a prima despencou de um dos galhos. O tal estava seco, apodrecido e não agüentou o corpinho dela. Partiu-se. Ambos ao chão. Ao ouvirem o choro as mães correram esbaforidas. Estava ela branca, chorava mais pelo medo que pela dor. Levaram broncas, promessa de surra e se afastaram da árvore por uns dias. Ressabiados, ansiosos.

Veio o tempo e os cresceu. Ele para um lado, ela para outro. O machado tomou-lhes o flamboaiã e boa parte das lembranças. Outras, entretanto, resistem feito calos, cicatrizes ou pinos. Metal imaginário, preso a ossos quebrados em outros tantos tombos que jamais chegaram a acontecer.

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